Neste 08 de março, dia em que se celebra no mundo as lutas das mulheres, a Defensoria Pública da União (DPU) encaminhou ao Ministério da Mulheres uma nota técnica com propostas para orientar a divulgação responsável de casos de feminicídios na imprensa e nas redes sociais digitais. A nota foi elaborada no contexto do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, instituído em agosto de 2023 pelo governo federal, com o objetivo de prevenir todas as formas de discriminação, misoginia e violência de gênero contra mulheres e meninas, através da implementação de ações governamentais.
Para a professora Terezinha Silva, integrante do grupo de pesquisa Transverso (PPGJOR/UFSC) e coordenadora de projeto que estuda a cobertura jornalística de feminicídios, ações como a proposta da Defensoria Pública são fundamentais para ajudar na prevenção primária das violências que resultam em feminicídios. “Finalmente, vemos que estão sendo encaminhadas ações que buscam incorporar efetivamente a imprensa e as redes sociais nas políticas públicas de prevenção e combate a essas violências que vitimam milhares de mulheres. É um passo muito importante, em função do papel central das mídias na informação e formação da cidadania”, considera ela.
No Brasil, uma mulher é assassinada a cada seis horas. Desde que a Lei do Feminicídio foi sancionada, em 2015, pelo menos 10.655 mulheres foram assassinadas no país em razão de seu gênero, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Somente em 2023, o país registrou 1.463 feminicidios. Em Santa Catarina, foram 56 mulheres assassinadas no ano passado. “A violência de gênero que produz os feminícidios é um problema de toda a sociedade, e precisa do empenho de toda a população e todas as instituições, incluindo as mídias”, reforça a professora. Ela lembra que em outros países, pactos semelhantes já foram lançados há alguns anos e contam com a adesão e compromisso dos meios de comunicação, o que tem se refletido em uma cobertura jornalística que progressivamente se torna mais responsável, ética e cuidadosa na divulgação dos crimes com motivação de gênero. Cita o exemplo da Espanha, onde esteve recentemente em período de pós-doutorado e onde é possível observar um conjunto de políticas como esta, desde o Pacto de Estado contra a Violência de Gênero, instituído em 2017 e atualmente em processo de renovação.
No Brasil, o governo federal deve lançar no próximo dia 19 de março o Plano Nacional de Ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios que foi instituído em agosto de 2023. As medidas propostas na nota técnica assinada pela defensora nacional de Direitos Humanos, Carolina Castelliano, e pelas defensoras regionais de Direitos Humanos da DPU e encaminhada neste 08 de março ao Ministério das Mulheres, tem como principal objetivo apresentar uma política pública que estabeleça parâmetros mínimos para a divulgação desses crimes nas mídias, inspirando-se em práticas bem sucedidas de outros países.
A partir da alta taxa de feminicídio no Brasil (a quinta no mundo), as defensoras destacam na nota técnica a importância de evitar uma narrativa midiática que fragiliza ainda mais a imagem da mulher, contribuindo para a perpetuação de estereótipos de gênero que as tornam socialmente vulneráveis. Entre as várias medidas propostas pela DPU estão, por exemplo, não divulgar detalhes do crime e nem imagens de mulheres com sofreram violência; evitar a espetacularização e privilegiar abordagens na prevenção e sensibilização para os problemas sociais da violência de gênero; evidenciar a desigualdade de gênero que está na base desses crimes; utilizar fontes de movimentos sociais e pesquisadoras especializadas no tema, entre outros. Elas destacam também que não se trata de censura ao trabalho da imprensa, mas sim de “construir coletivamente um protocolo de divulgação que evite o sensacionalismo, a espetacularização e o uso inadequado das ferramentas de comunicação”.
Além disso, a professora Terezinha lembra que todas estas propostas são o resultado também de muitos anos de discussão e de análise feitas pelos movimentos sociais, principalmente feministas, e pessoas que pesquisam o modo como os meios de comunicação tratam os crimes relacionados à violência de gênero, inclusive pesquisas feitas no Transverso. “As pesquisas têm identificado alguns avanços na cobertura nos últimos anos, mas é possível qualificar mais este tratamento dos crimes na cobertura da imprensa”.
Leia aqui a integra da Nota Técnica No 29 – DPGU/DNDH.